Todos os direitos humanos são importantes para os pobres porque a miséria e a exclusão estão ligadas à discriminação, a um acesso desigual aos recursos e às oportunidades e a estigma social e cultural.O fato de os direitos dos pobres lhes serem negados faz com que lhes seja mais difícil participar do mercado de trabalho e ter acesso a serviços básicos e recursos. Em muitas sociedades, são impedidos de gozar os seus direitos à educação, à saúde e à habitação simplesmente porque os recursos de que dispõem não permitem. Isso dificulta a sua participação na vida pública, a sua capacidade de influenciar as políticas que os afetam e de obter reparação das injustiças de que são alvo.A pobreza significa não só rendimento e bens materiais insuficientes, mas também uma falta de recursos, oportunidades e segurança que mina a dignidade e exacerba a vulnerabilidade dos pobres. A pobreza também tem a ver com poder: quem o detém e quem não o detém, tanto na vida pública como no seio da família. Para compreender e atacar mais eficazmente padrões enraizados, de discriminação, desigualdade e exclusão que condenam indivíduos, comunidades e povos a gerações sucessivas de pobreza é indispensável chegar ao âmago das redes complexas de relações de poder nas esferas política, responsabilidade de quem a sofre.
Uma abordagem global dos direitos humanos não se limita a abordar as idéias erradas e os mitos em torno dos pobres, ajudando antes - o que é ainda mais importante - a encontrar vias sustentáveis e eqüitativas para sair da pobreza Ao reconhecer que recai sobre os Estados a obrigação de proteger as suas populações da pobreza e da exclusão, essa abordagem faz ressaltar a responsabilidade dos governos pela criação de um ambiente que fomente o bem-estar público.Também permite que os pobres ajudem a formular políticas para a realização dos seus direitos e tentem obter reparação quando o sofrem abusos.
Essa abordagem tem sólidos fundamentos jurídicos. Todos os Estados ratificaram pelo menos 01(um) dos 07(sete) principais tratados sobre direitos humanos e 80% ratificaram quatro deles ou mais. Além disso, a comunidade mundial aprovou os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, que fixam, metas para esforços internacionais destinados a resolver o problema da pobreza e da marginalização.Independentemente das limitações econômica e social.Contudo, a pobreza é, com freqüência, vista como uma situação lamentável, mas acidental; ou como uma conseqüência m evitável de decisões e acontecimentos ocorridos noutros lugares; ou como sendo da exclusiva limitação de recursos, os Estados podem tomar medidas para combater a pobreza.E os Estados que estão em condições de prestar assistência deveriam tomar a iniciativa de ajudar.
A indiferença e uma visão estreita dos interesses nacionais podem ter efeitos tão negativos sobre os direitos humanos e o desenvolvimento quanto à discriminação.No ano passado, o presidente do Banco Mundial, Paul Wolfowitz, afirmou que "não é moralmente justificável que os países ricos gastem 280 bilhões de dólares -quase o PIB total da África e o equivalente ao quádruplo do total da ajuda externa para apoiar os produtores agrícolas".Num de seus últimos discursos como secretário-geral da ONU, Kofi Annan afirmou que considerava a ênfase dada à luta contra a pobreza uma das maiores realizações de seus mandatos.Sublinhou a profunda vulnerabilidade e os ataques à dignidade humana que acompanham a pobreza. É, mais importante, identificou os direitos humanos, a segurança e o desenvolvimento como' elementos mais pensáveis de um mundo em que todos possam viver em maior liberdade.Dado que um em cada sete habitantes do planeta passa fome, essa liberdade depende da nossa capacidade de vencer a pobreza como um dos problemas de direitos humanos mais graves do nosso tempo.
Autor: LOUISE ARBOUR, 59, formada em direito na Universidade de Montreal (Canadá), doutora honoris causa de 27 universidades, é a alta comissária para os Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas).